Devoção aos pobres, a marca do papa que escolheu o nome Francisco
Pontificado foi marcado por gestos de acolhimento direcionados a todos. Preocupação com os pobres foi levada dos primeiros votos na Argentina até o Vaticano
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Siga noDe Buenos Aires a Roma, em um caminho sem escalas de devoção aos pobres, profissão de fé pela caridade, coração aberto à humanidade. E, acima de todas as coisas, o amor a Deus. Em seus 88 anos de vida, o papa Francisco, batizado Jorge Mario Bergoglio, estendeu a mão a todos, independentemente da etnia, cor, gênero, posição política, visão de mundo. Primeiro líder da Igreja Católica natural das Américas, era um jesuíta argentino que escolheu o nome Francisco em momento crucial da sua vida – o conclave, em março de 2013 –, conforme contou no recém-lançado livro “Esperança”, primeira autobiografia de um sumo pontífice.
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“Quando o meu nome foi pronunciado pela septuagésima vez, explodiu um aplauso, enquanto a leitura dos votos continuava. Não sei quantos foram exatamente no final, não conseguia ouvir mais nada, o barulho encobria a voz do escrutinador. Nesse momento, enquanto os cardeais ainda aplaudiam e o escrutínio seguia, o cardeal Hummes (dom Cláudio Hummes, gaúcho, 1934-2022), que tinha estudado no seminário franciscano de Taquari, no Rio Grande do Sul, levantou-se e veio me abraçar. ‘Não se esqueça dos pobres’, disse-me. Aquela frase me marcou, eu a senti na minha carne. Foi ali que surgiu o nome Francisco”, escreveu.
Até chegar à decisão do conclave, no Vaticano, em 13 de março de 2013, Bergoglio percorreu uma longa jornada, trajetória de um pastor irado pelo seu rebanho, principalmente no período como arcebispo de Buenos Aires, capital onde nasceu em 17 de dezembro de 1936. Tinha como característica máxima a simplicidade.
“O meu povo é pobre, e eu sou um deles”, declarou, várias vezes, ao explicar a escolha de morar num apartamento e de preparar o jantar sozinho. Aos seus sacerdotes, sempre recomendou misericórdia, coragem apostólica e portas abertas a todos. “A pior coisa que pode acontecer na Igreja”, explicou em algumas ocasiões, “é aquilo ao que Lubac (Henri Lubac, cardeal francês, 1896-1991) chama ‘mundanidade espiritual’, que significa ‘pôr-se a si mesmo no centro’”.
O FILHO DE IMIGRANTES QUE CHEGOU A ROMA
Jorge Mario Bergoglio veio de uma família de emigrantes piemonteses (italianos): o pai, Mário, trabalhava como contabilista, enquanto a mãe, Regina Sivori, cuidava da casa e da educação dos cinco filhos. Diplomou-se em técnico químico, trilhando depois o caminho do sacerdócio ao ir para o seminário diocesano de Villa Devoto. Em 11 de março de 1958, entrou no noviciado da Companhia de Jesus.
Completou os estudos humanísticos no Chile e, no retorno à Argentina, obteve a licenciatura em filosofia no Colégio de São José, em San Miguel. De 1964 a 1965, foi professor de literatura e psicologia no Colégio da Imaculada de Santa Fé, e, no ano seguinte, lecionou essas matérias no Colégio do Salvador, em Buenos Aires. De 1967 a 1970, estudou teologia, licenciando-se também no Colégio de São José.
Em 13 de dezembro de 1969, Bergoglio foi ordenado sacerdote pelo arcebispo dom Ramón José Castellano. De 1970 a 1971, deu continuidade à preparação em Alcalá de Henares, na Espanha, até que, em 22 de Abril de 1973, fez a profissão perpétua nos jesuítas. Regressando à Argentina, foi mestre de noviços na Villa Barilari, em San Miguel, professor na faculdade de teologia, consultor da província da Companhia de Jesus e reitor do colégio.
Eleito provincial dos jesuítas da Argentina em 31 de julho de 1973, cargo que desempenhou durante seis anos, retomou o trabalho na universidade. Já na década de 1980 (de 1980 a 86), foi novamente reitor do Colégio de São José e pároco em San Miguel. Em março de 1986, seguiu para a Alemanha, onde concluiu tese de doutoramento. Na sequência, seus superiores o enviaram para o Colégio do Salvador, em Buenos Aires, e depois para a igreja da Companhia de Jesus, na cidade de Córdova, onde foi diretor espiritual e confessor.
NOVOS CAMINHOS NA ARGENTINA
A convite do cardeal Antonio Quarracino, Bergoglio se tornou seu colaborador em Buenos Aires. Em 20 de maio de 1992, o papa João Paulo II (hoje São João Paulo II) o nomeou bispo titular de Auca e auxiliar de Buenos Aires. Em 27 de junho daquele ano, recebeu, na catedral, a ordenação episcopal. Nomeado imediatamente vigário episcopal da região Flores, foi confiada a ele a tarefa de vigário-geral da arquidiocese.
Novos caminhos se abriam para o futuro papa. Em 3 de junho de 1997, foi promovido a arcebispo coadjutor de Buenos Aires. Quase nove meses depois, com o falecimento do cardeal Quarracino, sucedeu-lhe como arcebispo primaz da Argentina. Três anos mais tarde, foi sagrado cardeal.
Em outubro de 2001, foi nomeado relator-geral adjunto da 10ª Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, dedicada ao ministério episcopal. Quatro anos depois, em abril de 2005, participou do conclave no qual Bento XVI foi eleito papa. Até 2013, foi membro das congregações para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, para o Clero, para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, do Pontifício Conselho para a Família e da Pontifícia Comissão para a América Latina.
É autor dos livros “Meditaciones para religiosos” (1982), “Reflexiones sobre la vida apostólica” (1986) e “Reflexiones de esperanza” (1992), entre outros. Mais recentemente, lançou a primeira autobiografia de um papa: “Esperança”, em fevereiro de 2025.