Literatura

 Humberto Werneck lança "Viagem no país da crônica" 

Coletânea reúne alguns dos melhores textos no gênero produzidos pelo escritor mineiro, entre 2018 e 2021, quando editou o Portal da Crônica Brasileira 

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Jovem, ainda morando na Belo Horizonte natal, Humberto Werneck acreditava que um bom escritor tinha que usar barba e ter ado dessa para a melhor. Até que, um dia, viu um jovial (e bem vivo) Fernando Sabino (1923-2004), de mocassim, visitando a Praça da Liberdade. Seu antigo perfil foi por água abaixo. “A prosa mais arejada daquela geração influenciou muito a minha”, conta o jornalista e escritor.


Com lançamento neste sábado (7/6), “Viagem no país da crônica” (Tinta-da-China Brasil) celebra os 80 anos de Werneck, completados em fevereiro ado. O livro apresenta um retrato dos anos de ouro da produção do gênero no país, da qual sua geração “se alimentou no varejo”. A obra reúne os textos que ele escreveu entre 2018 e 2021, quando foi editor do Portal da Crônica Brasileira.


Iniciativa do Instituto Moreira Salles em parceria com a Fundação Casa de Rui Barbosa, o portal reúne milhares de crônicas publicadas na imprensa no século 20. No período em que Werneck atuou,eram 2,7 mil textos, de Antônio Maria, Clarice Lispector, Paulo Mendes Campos, Otto Lara Resende, Rachel de Queiroz e Rubem Braga – hoje o número alcança os 3,6 mil textos e um grupo maior de autores.


O portal conta também com a coluna “Rés do chão”, que chama a atenção do leitor para um determinado grupo de crônicas. “Piscadelas literárias” é como Werneck denomina os textos que ele assinou durante os quase quatro anos que atuou no portal. São estes que foram compilados em “Viagem no país da crônica”.


É uma viagem que pode ser acompanhada com um olho no livro e outro na tela do computador, já que a obra lista as crônicas citadas por Werneck em seus textos. Nos relatos, além de chamar a atenção para os escritos, ele acaba, de certa forma, biografando a crônica. Ela nasceu na parte inferior de uma página de jornal (ou seja, ao rés do chão) no século 19, na França, como o feuilleton (folhetim). Aportou no Brasil em 1852, trazida pelo poeta, diplomata e jornalista carioca Francisco Octaviano, que tinha ido para as bandas de lá.


Fusão irável

“A fusão irável do útil e do fútil”, determinou em 1859 Machado de Assis, que, a partir de 1870, aria a usar o termo crônica. Mas foi em meados do século 20 que ela atingiu seu ápice no país. “A imprensa carecia de gente boa para encher suas páginas e havia também uma fartura de bons escritores que precisava garantir um dinheirinho que os direitos autorais não davam”, comenta Werneck.


Para ele, o caso mais notável é o da revista “Manchete”, fundada em 1952, que reuniu em seu time de cronistas Henrique Pongetti, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e Rubem Braga. Foi com esse último que a crônica “pegou o elevador e subiu para o alto da página”.


“Rubem Braga começou a inovar nos anos 1930. (Até então) A crônica era muito crítica, florida, literária no mau sentido. Era menos crônica e mais artigo. Ela já tinha uma carinha mais brasileira, um pouco com Machado, com João do Rio, mas essa malemolência vem com o Rubem Braga, que contamina, benignamente, todo mundo que vem em seguida.” A Editora do Autor, que Braga e Sabino fundaram em 1960, consolida a produção esparsa da imprensa em livros.


O que é uma boa crônica? A pergunta parece banal, mas a resposta, diz Werneck, não é fácil. “Rubem Braga dizia que a ‘boa crônica dava a impressão que tinha sido escrita só para mim’. Sem megalomania, a gente sempre falava ‘o meu cronista’”, continua. O dele continua sendo Braga, “disparado”, ainda que goste muito de Antônio Maria, que só teve livros publicados após sua morte, aos 43 anos.


Werneck ou a atuar como cronista só na maturidade. Nunca lhe faltou assunto, mas sobrou dor de cabeça. Certa vez, para “O Estado de São Paulo”, onde escreveu semanalmente, de 2010 a 2020, fez uma digressão sobre o copo de requeijão como “um dos símbolos que avacalha a relação amorosa”.


O texto dizia algo assim, ele relembra: “Se o namorado pede um copo d’água e recebe num copo de requeijão, o processo de degeneração do amor já começou. Eles deixaram de ser amantes e viraram parentes. Na separação, ninguém quer saber do corpo de requeijão.”


A crônica valeu a Werneck uma carta à Redação do vice-presidente da maior empresa brasileira do segmento. “Já que o copo não pode se defender, tomo eu a defesa dele”, escreveu, sem medo do ridículo, o executivo. O que poderia dar início a uma ótima crônica.


Biografia de Drummond

“Velho aniversariante comovido agradece seu belo trabalho.” Em outubro de 1977, Humberto Werneck recebeu este telegrama de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987). A despeito do conteúdo e, principalmente, de seu autor, ficou arrasado. Drummond lhe agradecia pela matéria de capa da revista “Veja” por ocasião de seu 75º aniversário.

Werneck escreveu a reportagem sem falar com o poeta. “Mesmo com dois grandes padrinhos, Fernando Sabino e Pedro Nava, não consegui ouvi-lo.” Anos mais tarde, quando Drummond começou a dar mais entrevistas, tentou falar com ele novamente, para a “Isto É”.

Outra negativa, desta vez por meio de uma carta escrita à mão: “Fui apenas um burocrata com fumaças literárias”. Werneck conta essa história para falar sobre o processo da celebrada (e adiada) biografia do poeta, projeto para a Companhia das Letras a que ele se dedica desde março de 2016.

“É muito difícil escrever a biografia de um cara que teve uma vida, em boa parte, nos trilhos.” Uma parcela dos originais já foi entregue, outra deve ser em breve. Werneck, no entanto, não faz previsões. “Espero que saia antes de mim.”

“VIAGEM NO PAÍS DA CRÔNICA”
• De Humberto Werneck
• Tinta-da-China Brasil (304 págs.)
• R$ 99,90

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